sábado, junho 23, 2007

O Imperador e o Rouxinol

Há muito, muito tempo, o grande Império Chinês era governado por um poderoso imperador. O seu magnífico palácio era feito de uma porcelana muito delicada e estava situado no meio do jardim mais belo que jamais existiu no mundo. Não eram só as flores que eram requintadas; os jardineiros tinham também pendurado minúsculas campainhas de prata entre essas flores, de modo que por entre os botões soavam belas melodias.
No extremo do jardim ficava uma frondosa floresta e, para lá desta, o mar azul e profundo estendia-se até perder de vista. Foi aí, junto ao mar, que um rouxinol se instalou. Empoleirado nos ramos de uma árvore imponente, todos os finais de tarde o rouxinol abria o seu bico e cantava de um modo tão belo que até os laboriosos pescadores paravam o que estavam a fazer para escutar as suas notas cristalinas.
Muitos eram os estranhos que vinham ao palácio imperial para admirar a porcelana e os tesouros no seu interior. É claro que vinham também atraídos pelos elaborados jardins e pelos bosques que ficavam por detrás destes, mas fosse qual fosse o visitante que ouvisse o rouxinol cantar não podia deixar de exclamar:
- Tudo aqui é inacreditavelmente belo, mas nada se compara ao canto deste pássaro mágico.
Quando regressavam aos respectivos países, alguns dos visitantes escreviam mesmo livros a contar as coisas extraordinárias que haviam visto, acabando invariavelmente por referir o canto do rouxinol, como a mais bela de todas. Ora, o Imperador gostava muito de ler livros acerca do seu país, apreciando particularmente as descrições do seu fantástico palácio e das suas propriedades. Sentia-se orgulhoso de possuir coisas com tanta magnificência. Podem, pois, imaginar a sua surpresa quando leu que o canto do rouxinol tinha sido considerado de valor superior ao dos seus preciosos bens.
- Porque foi então que nunca ouvi esse pássaro cantar, apesar de este viver nas minhas terras? – perguntou aos seus cortesãos. – Tragam-mo cá esta noite, pois tenho de ouvi-lo cantar.
Os cortesãos nunca tinham ouvido falar de nenhum rouxinol. Percorreram o palácio de uma ponta a outra, em busca de alguém que tivesse ouvido falar dele, mas em vão.
- Vossa Alteza Imperial, talvez a história que leu no seu livro tenha sido inventada pelo autor – sugeriram os cortesãos.
- Disparate! – respondeu o imperador. – Têm apenas de procurar com mais afinco.
Os cortesãos estavam já quase sem saber o que fazer quando encontraram uma rapariguinha que trabalhava nas enormes cozinhas do imperador.
- Já ouvi o rouxinol a cantar diversas vezes, sobretudo quando vou até à praia visitar a minha mãe – respondeu ela. – É um som verdadeiramente maravilhoso.
Os cortesãos insistiram com a empregada da cozinha para que esta os levasse até à árvore onde vivia o rouxinol, mas eles próprios não faziam sequer ideia de como soava o seu canto.
Ao caminharem pela floresta que existia para lá dos jardins, ouviram um som grave e ressonante.
- Que bela canção! – exclamaram. – Já encontrámos o rouxinol.
- Não, nada disso – respondeu a rapariga. – Isso é apenas uma vaca a chamar o seu vitelo.
De seguida os cortesãos ouviram um som entre o borbulhante e o chilreante.
- Aí está ele, eis o rouxinol – declararam. – Como canta bem!
- Não – objectou a rapariga, olhando-os admirada –, isso é uma rã, que nos chama do lago.
Nesse preciso momento, o rouxinol começou a cantar. Uma torrente de harmoniosos sons preencheu os ares. A empregada da cozinha apontou então para um pequeno passarinho castanho em cima de um ramo.
- Aquele é que é o rouxinol – afirmou.
Os cortesãos ficaram espantados com o facto de um tal pássaro, de uma cor acastanhada, poder produzir sons tão belos, mas ainda assim convidaram-no para os acompanhar ao palácio naquela noite, de acordo com as ordens do imperador. O rouxinol ficou estupefacto por ser convocado daquela maneira, mas lá foi de bom grado cantar para o dono daquela palácio, daquele jardim, daquele bosque e daquele mar.
Toda a corte se juntou ao imperador para ouvir o rouxinol cantar naquela noite. Até fora mandado fazer um poleiro dourado, especialmente para a ocasião.
Quando as primeiras notas do rouxinol encheram os ares, rolaram lágrimas pela face do imperador. Nunca ele tinha ouvido nada assim tão belo! Todos os demais na sala estavam igualmente comovidos. O pássaro estava a ter um grande sucesso.
Depois disso, o rouxinol passou a viver no palácio. Foi instalado numa gaiola dourada e doze criados cuidavam dele. Duas vezes por dia era-lhe permitido esvoaçar ali pelas redondezas, mas um dos criados mantinha-o preso por um fio de seda atado a uma das suas patas, por isso nunca podia voar livremente.

(continua)
[Contos de Hans Christian Andersen]

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